quinta-feira, 30 de abril de 2009

O retomar da escrita - O regresso às memórias

Depois de largo tempo sem escrever algo, retomo hoje a escrita, relatando o nosso último almoço convívio em Fátima e referindo aqui algumas leituras que tem sido efectuadas por pessoas que na sua pesquisa internética deparam com termos com que se relacionam.

Fiz aqui referência à existência de um Destacamento de Intendência em Nambuangongo e de um capitão que o comandava. Não referi o nome. Pois o filho do referido capitão, achou interessante o relato aqui colocado e agradeceu lhe ter permitido recordar que mais alguém por lá andou na mesma altura do seu pai. Pois, o nosso Cor. Carlos Soares também já nos deixou em 2005.

No diálogo que tive com o filho, referi da intenção do blog que pretendia que quem o lesse pudesse acrescentar algo que servisse para a história. Transcrevo parte do que escrevi para o filho acerca das recordações que tinha do convívio com o pai:

"A história da Intendência em Nambuangongo, deverá ser relatada. Pelo menos, factos que sirvam para realçar o tipo de actividade que desenvolviam os vários sectores da guerra. O seu pai, recordo-o perfeitamente, porque com alguma assiduidade convivíamos, especialmente à hora do chá. O nosso capitão Moreira, que já referi no blog, tinha por hábito (quando era possível) fazer esquecer as agruras, convidar o seu pai para o chá e torradas e era aí que conversávamos. Recordo-o como uma pessoa delicadíssima e atenciosa para os que andavam pelos exteriores do arame farpado".

Relendo estas palavras, reforço o aspecto da atenção que recebíamos por parte, dos que só saíam do "arame farpado" quando eram obrigados por uma qualquer deslocação. Sentíamos que os mesmos percebiam a diferença e procuravam diminuir o esforço que fazíamos em relação às obrigações que tínhamos de "sair para a mata", através da conversa simpática e amena e procurando que não nos faltasse o conforto possível. Como exemplo, recordo a água quente, para lançar no balde chuveiro, que existia sempre quando estávamos para chegar. Aqui andava, quase sempre a mão do alferes António A.

Quanto ao chá, talvez não fosse com a assiduidade que pode transparecer, mas foi uma imagem que me ficou. Duas ou três vezes que essa cerimónia tivesse sido realizada, ficou gravada. Isto de beber chá e comer torradas, em Nambuangongo, talvez muito gente não acredite, mas com o nosso Capitão Moreira era um requinte que lhe assentava bem.

Anexo algumas fotos que simpaticamente João Miranda Soares me enviou, pertença do seu pai e tiradas em Nambuangongo:


Este era o morro onde estávamos (à direita ainda se vê parte da casa onde dormíamos). Na sacristia da capela e por trás dormiam os militares do meu grupo. A pista de aviação terminava aqui nesta subida.

Este era o morro do Comando. À esquerda era a saída para Zala. Para a direita saía-se para o Quixico.

O Destacamento de Intendendência

As traseiras da Intendência

In memoriam



Almoço comemorativo do regresso (2.3.1965)

Foi em Fátima, no passado domingo dia 26 de Abril.
Depois de assistir-mos à missa, no exterior da Basílica, dirigimo-nos para a Casa das Irmãs Dominicanas onde cerca de 200 pessoas (metade família) conviveram.
Uma vez por outra, vamos a Fátima. Este tipo de cerimónia, neste local, se, por um lado tem pouco convívio, tem, por outro lado, a possibilidade de reflectir e lembrar os que nos deixaram em ambiente propício.
A sala não se prestava para qualquer tipo de discurso. Pediu-se, então, que em cada mesa, se reflectisse sobre os nossos camaradas desaparecidos.

Recordei, um já grande número dos que nos deixaram:
Do meu grupo: o Manuel dos Santos, Salgueirão, Viana, Marreiros, Furriéis Simão Abrantes e Rebocho. Depois o comandante TC Alves Pereira, o segundo, Mj. Pimenta de Castro e depois uma serie de capitães, dos quais só resta o Torres Mendes, que não pôde aparecer. Recordei, então o Dias de Lima, o Sousa Moreira, o Nelson Valente, o Luís Ataíde, o Araújo, os dois que foram substituir estes últimos, o Júdice e o Abreu, e o Beleza dos Santos. O tenente Dionísio. Dos alferes, recordei o Padre Lomba, o Almeida Rego, o Amadeu Cunha Lima, o Manuel Maria Beça Múrias, o Luís Ramos da Silva, o José Joaquim Delfim de Matos, o Horácio Silveira, o Mário Rodrigues e o Roque. Dos primeiros sargentos, recordei o Meira. Estiveram todos presentes na minha lembrança e recordei alguns diálogos e vivências que tive com os mesmos.

Certamente, no próximo convívio, voltaremos a Fazendas de Almeirim, pois é o local que reúne melhores condições, na apreciação da maioria. Uma vez por outra, iremos a Estremoz. É um local simbólico, (aqui formou-se o Batalhão) onde estão gravados os nomes dos nossos mortos em combate.

Esperemos, que esta movimentação ainda se faça por muitos anos. Os alferes estão nos 70/72 anos. Os sargentos, nos 68/69 anos e os outros militares nos 67/68 anos.

Este ano o convívio foi alargado à sociedade civil que aquando da nossa passagem pelo sul (Bailundo, Bela Vista, Chinguar, General Machado, Andulo e Caianda) nos recebeu com carinho e ajudou a passar o tempo que faltava para o nosso regresso. Alguns casaram com jovens de quem se enamoraram na região. A representar os que tão bem nos receberam, estiveram familiares da conhecida casa do Chinguar, Seabra, Moura & Irmão. Sugiro que nos próximos anos, alarguem o convite a outros civis que nos estão ligados.